Blogue do livro "Na Rota do Yankee Clipper" - de José Correia Guedes @ Chiado Editora, Lisboa. Dezembro de 2012.

Prémio Jane Froman

Jane Froman , a cantora que ficou gravemente ferida no acidente de Lisboa , sofreu nada menos que 39 cirurgias até poder voltar a andar sem quaisquer ajudas . Apesar disso , viveu toda a vida sob o espectro da amputação da perna direita , a qual nunca recuperou das terríveis lesões sofridas em 1943 . Ainda em Lisboa , no Hospital de S. José , foi pela primeira vez confrontada com essa possibilidade , mas Jane Froman recusou enérgicamente a decisão dos médicos portugueses , provavelmente porque se sentia internada num "hospital medieval" , como ela própria diria mais tarde , numa entrevista . Mas a opção parecia ser a correcta , dado que nas décadas seguintes essa hipótese voltou a ser ponderada várias vezes .
A sua luta e a sua coragem levaram o Instituto de Reabilitação do Missouri , estado de onde Jane era natural , a criar um prémio com o seu nome para ser atribuído anualmente ao doente que mais determinação tenha revelado na ultrapassagem das suas limitações físicas . Apesar da cantora ter falecido em 1980 , o prémio ainda hoje continua a ser atribuído .

Os Comissários de Bordo

Era duríssimo o trabalho dos dois comissários de bordo que atendiam às necessidades dos passageiros e demais tripulantes dos Clipper . Estava a seu cargo o abastecimento de comida e bebidas antes de cada viagem e eram responsáveis por todo o serviço a bordo , sempre efectuado segundo as normas dos melhores restaurantes e hoteis da época . As refeições eram embarcadas parcialmente cozinhadas , sendo o "aquecimento" final efectuado pouco antes das mesmas serem servidas , mas já os "cocktails" e outros serviços de BAR eram produzidos na altura e podiam ser pedidos durante qualquer momento da viagem . Como a sala de jantar só podia servir 14 pessoas de cada vez ( Ken Follet , "Night Over Water" ) e havia sempre cerca de 40 passageiros , na versão "sleeper" , eram necessários três turnos de serviço , às 18 , 19.30 e 21 horas , no caso do jantar , por exemplo . Para o pequeno almoço e almoço o processo era idêntico . Acontece que o serviço era extremamente personalizado , sendo a comida e as bebidas servidas ao critério dos clientes , e as mesas "postas" com porcelanas e talheres de prata antes de cada serviço , para posteriormente serem "levantadas" e limpas . A época das bandejas com talheres de plástico ainda vinha longe .
Após o jantar dos passageiros , os dois comissários de bordo davam início ao serviço ao cockpit , tratando da alimentação dos outros tripulantes . Findo este capítulo era altura de transformar as poltronas dos passageiros em camas , para estes passarem a noite , e era aos dois comissários que competia fazer esses preparativos . Como se tudo isto não bastasse , eram ainda eles quem tinha que zelar pela segurança dos passageiros , em casos de turbulência ou qualquer emergência que pudesse acontecer , incluindo pequenos serviços médicos prestados em voo .
UFFF!!!!

Decreto-lei 32:331

A construção do Aeroporto Marítimo de Cabo Ruivo foi autorizada pelo Decreto-lei 32:331 , de 19 de Outubro de 1942 . Assinam o decreto , entre outros , Oscar Fragoso Carmona , António Oliveira Salazar e Duarte Pacheco .

Nos Tribunais

A revista "Time" de 23 de Março de 1953 , dez anos depois do acidente , dá conta do andamento ( muito lento , não é só em Portugal ... ) dos processos movidos contra a Pan Am por parte de algumas das vítimas , exigindo indemnizações por perdas e danos sofridos . A cantora Jane Froman reclamava dois milhões e meio de dólares ( uma imensa fortuna , há cinquenta anos ) como compensação pelo atroz sofrimento em que vivera nos anos que se seguiram ao acidente do Clipper , enquanto a acordeonista da sua orquestra , Gypsy Markoff , exigia um milhão pelos seus ferimentos . O ex-marido de Froman , Donald Ross , ficava-se por uns modestos cem mil dólares , mas os advogados da Pan Am contestavam todos esses pedidos , com a alegação que a Convenção de Varsóvia de 1929 limitava as indemnizações exigíveis por acidente aéreo a 8.291 dólares por pessoa , apenas . No entanto , a mesma Convenção determinava que estes limites apenas eram aplicáveis se se provasse que não houve negligência ou culpa por parte da tripulação ou da empresa . Nesse caso , qualquer valor podia ser exigido .
Ora , como a comissão de inquérito atribuiu a responsabilidade do acidente ao Comandante Sullivan , o caminho ficou livre para os tribunais decidirem quais os montantes a conceder aos sobreviventes e às famílias das vítimas mortais . No entanto , não deixa de me surpreender a forma como a responsabilidade foi atribuída ao piloto , uma vez que, na altura , ainda não existiam "caixas negras" com gravadores de voz e de parâmetros de voo , isto para além do facto de o Cte Sullivan nunca ter conseguido explicar a razão porque perdeu o controle do aparelho .

Os Motores do B314

Eram poderosos e muito sofisticados ( para a época ) os quatro motores que equipavam os Boeing 314 e que trabalhavam incansavelmente durante horas a fio , sem manifestarem problemas de maior . Tratavam-se dos "históricos" Wright Double Cyclone radiais , de 14 cilindros , arrefecidos por ar e debitando potências da ordem dos 1.600 cavalos , cada , tendo sido o primeiro motor a utilizar gasolina de 100 octanas . Havia um indicador de temperatura para cada uma das 56 cabeças de cilindros e era possível fazer alguns trabalhos de manutenção e afinação , em voo . Para isso , o mecânico "gatinhava" através de um túnel , situado no meio da asa , que dava acesso aos quatro motores .
As hélices descreviam um círculo de cinco metros de diâmetro e eram frequentemente polidas , para reduzir o atrito ( imagem de baixo ) , como fazem hoje os surfistas com as pranchas . O aparelho podia voar com dois motores do mesmo lado fora de serviço , tal como era exigido pelo processo de certificação , e os pilotos também tinham que demonstrar saber controlá-lo e fazer aterragens nessa configuração, durante os voos de treino .
Contráriamente aos motores de jacto , que demoram cerca de sete segundos a acelerar , os motores de explosão reagem imediatamente aos movimentos do "acelerador" , facto que levou os investigadores do acidente de Lisboa a interrogarem-se porque razão o Cte Sullivan não "borregou" ( abortou a amaragem ) quando se apercebeu que o Yankee Clipper estava prestes a bater nas águas do Tejo .



Correspondência

Envelopes com correio transportado no Yankee Clipper recuperados após o acidente de Fevereiro de 1943 . Note-se o carimbo com a informação "Damaged by Sea Water " .
Estes documentos encontram-se patentes no site www.filatelicamente.online .


A Vida a Bordo dos Clippers

O interior dos Clipper desta geração era extremamente luxuoso e confortável , um pouco a exemplo dos navios de passageiros da época , verdadeiros palácios flutuantes .
O Boeing 314 tinha dois "decks" , sendo o superior destinado ao cockpit e zona de lazer da tripulação , além de incluir também um compartimento para carga . Mas era no "deck" inferior que ficavam os compartimento destinados aos passageiros , cujas poltronas se transformavam em camas , à noite . Havia também zonas de confraternização , louças de porcelana , cálices de prata , lavatórios luxuosos e refeições quentes servidas por comissários vestidos a rigor . Um dos "lounges" servia de área de lazer , mas era transformado em restaurante à hora das refeições .
Para melhorar o conforto , os salões eram forrados com tapetes e as paredes cobertas com espessos cortinados , tudo com o intuito de "abafar" o ruído provocado pelos motores .
Os compartimentos , decorados alternadamente com dois esquemas de cores diferentes , podiam acomodar dez passageiros cada , durante o dia , mas apenas seis durante a noite , uma vez que então as poltronas se convertiam em camas .
Ficaram famosos os Clipper Cocktails servidos a bordo , uma mistura de Gin , Vermute e Grenadine , a que se acrescenta gelo moído , sendo o produto final servido num copo gelado .

Escalas Portuguesas na Rota Atlântica

(...) A escala da Horta estava dotada de duas embarcações especiais , uma vedeta rápida e um barco-tanque para reabastecimento dos aviões . Os Clippers amaravam e descolavam na zona marítima a leste da Horta , normalmente abrigada dos ventos predominantes de W e NW . No interior da baía amarravam a uma das bóias próprias e ali faziam o abastecimento , enquanto os passageiros desembarcavam e iam espairecer em terra . Entre os apoios prestados aos voos da PAA é de salientar o das telecomunicações e informações meteorológicas , ambos prestados pela nossa Marinha , que ali tinha uma eficiente Estação Rádio Naval , e um serviço de Meteorologia , no tempo em que só a Marinha e a Faculdade de Ciências executavam cartas sinópticas e efectuavam previsões .
(...) Mas os Clippers da Pan American acrescentaram durante anos ( 1937-1944 ) esse novo espectáculo que desviava dos seus afazeres os curiosos faialenses , para irem ao cais . Olhavam a manga de vento , viam o trajecto e a posição da vedeta rápida que se punha ao largo , em estado de prontidão , cada qual fazia a sua previsão sobre as manobras de amaragem e , por fim , os comentários críticos . Era o dia de "S. Avião".
Ficou registado um episódio inédito , em fins de 1939 , quando dois Clippers estacionaram vários dias na bóia , retidos por excesso de ondulação que não permitia a descolagem . Os passageiros dedicaram-se a um passatempo invulgar : criaram um jornal com o título "As Ondas da Horta " .
(...) Tendo sido concedida autorização pelo governo português aos EUA para construção de um aeroporto em Santa Maria , esta infraestrutura viria a ser utilizada pela PAA com os seus quadrimotores Lockheed L-749 nos voos transatlânticos , em substituição dos Clippers . Estes foram requisitados pela US Navy e 3 deles foram vendidos à BOAC .

- Excertos de "Recordando os Famosos Clippers" , texto da autoria do Comandante Silva Soares para a revista Sirius .

Para a História

Fotografia - com banda de música , em fundo - da tripulação que realizou o primeiro voo comercial transatlântico , em 29 de Junho de 1939 . O aparelho utilizado na ligação entre Nova Iorque e Lisboa era o Boeing 314 "Dixie Clipper" , comandado por R.O.D. Sullivan , o primeiro da esquerda , em baixo . Ele seria também o comandante do "Yankee Clipper" quando este se despenhou no Tejo , em Fevereiro de 1943 , tendo sobrevivido ao acidente para acabar por ser responsabilizado pelo mesmo .
Com mais de 14.000 horas de voo , 3.200 das quais aos comandos dos "Clipper" , Sullivan , com 50 anos , era um dos pilotos mais experientes da Pan Am . Mesmo assim , não conseguiu explicar porque razão , depois de ter colocado os quatro motores em "idle" aos 400 pés e ter "deslizado" suavemente para as águas do Tejo , súbitamente iniciou uma volta quando estava a poucos metros acima do rio . Uma das asas bateu na água e a tragédia aconteceu .
No inquérito , após o acidente , o Comandante Sullivan declarou que sentiu a aeronave "afundar-se" quando estava prestes a amarar e , em vez de acelerar os motores para recuperar altitude optou por um "pranchamento" ( inclinação lateral ) , decisão fatal que não conseguiu explicar . Uma vez confirmado que nenhuma avaria foi detectada após a análise dos destroços do Boeing , Sullivan assumiu a responsabilidade pelo acidente e abandonou a Pan Am e até o seu país , os Estados Unidos , nunca mais tendo voltado a sentar-se aos comandos de um avião . Segundo o relato da "Time" de Setembro de 1943 , constava que o infeliz piloto se tornara mestre de um navio costeiro português , circunstância que não consegui confirmar . A útima vez que se teve notícias de R.O.D. Sullivan estava ele na Liberia a trabalhar para a Liberian American Development Co , também como mestre de uma embarcação . Note-se que a esmagadora maioria dos pilotos dos Clipper provinha da Aviação Naval tendo , portanto , conhecimentos náuticos .
Final trágico para quem viveu uma das mais fascinantes carreiras profissionais que existiam na época , ser piloto de uma companhia de aviação internacional .

Na Horta

O porto da Horta , nos Açores , era utilizado como base estratégica de reabastecimento dos Boeing 314 , uma vez que estas aeronaves não tinham autonomia suficiente para fazerem a ligação entre Nova Iorque e Lisboa de uma só vez . Porém , a paragem no arquipélago trazia frequentemente problemas de difícil solução , nomeadamente as dificuldades criadas à descolagem pela ocorrência de ondas no mar . Limitados a operar em águas com altura de vaga inferior a um metro , os Clipper eram por vezes obrigados a esperar durante horas até que o mar acalmasse , para poderem descolar . Existem fotografias de dois ou mais Clippers ancorados no porto da Horta à espera de mares mais calmos para poderem seguir viagem . Isto dá uma ideia da dimensão do problema .
Sempre que um destes aparelhos pernoitava em qualquer lugar , uma âncora era lançada ao fundo do mar , para evitar que alguma corrente o afastasse do porto . Mesmo assim , era nomeada uma equipa de vigilantes para permanecer todo o tempo junto do Clipper , para actuar caso essa âncora , por qualquer razão , se soltasse .
Por vezes eram feitas várias tentativas de descolagem quando as condições de mar eram relativamente agitadas . Uma das funções do mecânico de voo era monitorar o acelerómetro do cockpit durante a corrida de descolagem e avisar o comandante quando este atingisse valores próximos dos 8G , ou seja , oito vezes a aceleração da gravidade . Este seria o limite da resistência estrutural da fuselagem ao impacto das ondas , segundo um texto publicado numa revista técnica da época . No entanto , não me foi possível confirmar este número no Manual de Voo do B314 , que o não menciona no capítulo "Limitações" .



Carta de Rota

Curioso exemplar de uma carta de navegação entre a Bermuda e a Horta , em que a rota é "construída" sobre uma carta de previsão meteorológica . Quando confrontados com este tipo de situação meteorológica - dominada por um centro de altas pressões - os pilotos planeavam o voo de forma a tirarem o máximo partido possível das condições de vento . Tratando-se de um anti-ciclone , a circulação das massas de ar faz-se no sentido do movimento dos ponteiros do relógio , pelo que este "desenho" de rota permitiria ter vento favorável durante quase toda a viagem . Apenas à chegada aos Açores a componente seria nula , ou perto disso , uma vez que a previsão aponta para a possibilidade de vento "cruzado" , ou seja , com uma incidência de 90 graus sobre a rota .
Segundo Ken Follet , no livro "Night over Water" , o voo do Clipper entre a Terra Nova e a Irlanda demorava nove horas , enquanto a viagem de regresso , na mesma rota , demorava mais de dezasseis . Isto dá uma ideia da influência que os ventos dominantes , no Atlântico Norte , exerciam sobre o planeamento das operações .

Chegada a Lisboa

A fotografia documenta o desembarque em Lisboa dos passageiros do "Dixie Clipper" após uma viagem que durou exactamente 24 horas e três minutos , incluindo uma paragem de cerca de uma hora e meia na Horta , para reabastecimento . O voo seguiria depois para Marselha .
Toda a estrutura de apoio existente no Aeroporto Marítimo de Cabo Ruivo foi instalada pela Pan American e destinava-se principalmente à operação dos Clippers . O mesmo se aplicava a todos os destinos que , na altura , eram servidos por estes hidroaviões . Esta complicada e caríssima logística , associada aos problemas causados pelas marés da Horta e pelo gelo frequentemente encontrado na costa norte atlântica , acabaria por ditar o fim das operações aeronavais em favor do serviço entre aeroportos metropolitanos em ambos os lados do Atlântico .

Um Relato

Texto de Blair Butterworth no Seattle Times de 22/03/2005 .

" A primeira vez que ouvi falar de George Kennan ( mais tarde embaixador dos EUA na Jugoslávia ) foi cerca de 1940 , quando o meu pai foi enviado para Espanha e Portugal onde , em colaboraração com os ingleses , se dedicava a comprar materiais estratégicos - tais como tungsténio - para evitar que estes chegassem às mãos dos alemães , claramente preferidos pelos governos da península ibérica durante a II Guerra .
Em Fevereiro de 1943 , o Yankee Clipper da Pan Am em que ele viajava despenhou-se no rio Tejo , em Lisboa ( este foi o voo em que a cantora Jane Froman viajava ; o meu pai partiu uma janela com o cotovelo e puxou-a , juntamente com alguns outros , para fora do aparelho ).
Ao ouvir as notícias do acidente , Kennan , na altura membro da nossa embaixada em Lisboa , deslocou-se imediatamente para o local onde os sobreviventes estavam a ser recebidos . Embora 25 dos 37 passageiros tivessem morrido , o meu pai , um excelente nadador , conseguiu sobreviver apesar de ter amarrado uma pasta cheia de documentos secretos aos seus pés , para garantir a sua segurança . Quando a lancha o desembarcou no cais - gelado e em choque - George Kennan pegou nele e na pasta e levou ambos para um hotel , chamou um "marine" para guardar o quarto , "enfiou" o meu pai numa banheira com água quente , mandou vir uma garrafa de "Fundador" e , então , usando clips e molas de roupa , pôs os documentos a secar ."

Cabo Ruivo , 1942

Registo dos movimentos de passageiros , carga e correio processados através do Aeroporto Marítimo de Cabo Ruivo em 1942 , vendo-se do lado direito os valores correspondentes à Pan American Airways . A companhia transportou 508 passageiros entre Lisboa e os EUA e apenas 6 entre Lisboa e a Horta . Curioso também referir que em Cabo Ruivo foram recebidas mais de mil toneladas de carga transportada nos Clipper da Pan Am .

Ponto de Não Retorno

Aproveito para esclarecer um simpático comentário inserido no post anterior pelo leitor "Carlos" .
A determinação do "ponto de não retorno" fazia , e faz , parte das "boas práticas" da navegação aérea . A diferença é que , actualmente , com o benefício de sistemas de navegação apoiados em tecnologia GPS , basta carregar numa tecla do FMGS para saber qual a distância , o tempo e o combustível necessário para chegar ao aeroporto mais próximo , em caso de emergência . Na anterior geração de aviões havia que fazer cálculos complexos e relativamente demorados para chegar à mesma conclusão , possívelmente com alguma margem de erro .
O "ponto de não retorno" corresponde ao momento em que o avião se encontra equidistante , em termos de tempo de voo , de dois aeroportos de rota susceptíveis de serem utilizados em caso de emergência . Em condições teóricas de vento nulo , este ponto corresponderia a metade da distância entre os dois aeroportos em causa , mas como o vento existe e costuma ser forte , há que ter em conta esse factor para determinar qual o destino a tomar , em caso de necessidade . Assim , uma vez passado o "ponto de não retorno" o avião terá que prosseguir para o aeroporto de rota seguinte , ficando impedido de voltar para trás , aconteça o que acontecer .
Sobre a possibilidade de os Clipper voarem , por vezes , cem metros acima do nível do mar para evitarem os ventos fortes de altitude , não posso confirmar tal procedimento . Nada disso consta do Manual de Voo do Boeing 314 como prática recomendável , mas admito que fosse verdadeira . Lembro que a esmagadora maioria dos pilotos destes aviões provinha da aviação militar e que , na altura , decorria a II Guerra Mundial . Portanto , era mais que provável que , por vezes , fossem adoptados procedimentos não-standard para resolver problemas que surgissem durante a viagem .
O voo a muito baixa altitude aumenta exponencialmente os consumos de combustível e envolve alguns riscos , nomeadamente em caso de turbulência , pelo que só deveria ser adoptado em caso de absoluta necessidade .

O Carimbo

Em Junho de 1939 teve lugar o primeiro voo comercial transatlântico da História , protagonizado pelo "Yankee Clipper" o qual , além de passageiros e bagagem , transportava também correio . Durante a escala na Horta as autoridades locais decidiram criar um carimbo comemorativo da efeméride para marcar todo o correio que , pela primeira vez , atravessava o Atlântico , encomendando a um artífice local a produção do mesmo . Tudo correu pelo melhor e as cartas com o carimbo desse dia histórico são hoje ávidamente disputadas pelos coleccionadores , só que ... Vejam bem . O avião representado no carimbo parece ser um DC3 Dakota , em vez do Boeing 314 que , de facto , inaugurou o transporte aéreo comercial transatlântico . Acontece que os DC3 eram vistos frequentemente nos Açores , nomeadamente nas Lajes , pelo que foi esse o modelo escolhido por quem fez o molde , em vez do Yankee Clipper , que ninguém conhecia .